sexta-feira, 29 de abril de 2016

O Vasto Oceano



Vasto Oceano

O que se esconde para lá
Do vasto e imenso oceano?
Onde a vista não alcança

Desilusão?
Memórias de uma vida
Preso ao passado?
Coisas do além?

Temos vivido na ilusão
De que podemos voar
Não!
Não sem asas,
Sem as fazer crescer

O rio da vida flui,
Desagua no vasto oceano
E nunca vemos o fim

Segue o percurso do vasto oceano
Ele é uma guerra mortal!
Uma batalha onde ninguém ganha

Podes seguir a maré do oceano,
Andar à deriva no rumo que te ordenam
Um rumo que não é para ti
Mas ao que te habituas,
E onde nadas regelado
Em puro sofrimento

Ou podes nadar contra a maré,
Ser um louco entre os sãos,
Abrir as portas do novo mundo
E definir a maré de um oceano onde eras nada

Podes combater tudo
Acreditar!
E verás que o vasto oceano
Torna-se maior
E a vista nada alcançará,
Mas serás livre

E por mais difícil que seja
Quebrar a maré,
A meio do vasto oceano,
No fim do teu caminho
Vais poder olhar para trás
E a vista alcançará muito mais
Do que quem seguiu a corrente!

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Quero



Quero saber quem és
Quem és tu que te anuncias
Sob os prados de rosas brancas
Entre sonhos e alegorias
A ser a verdade das fantasias?

Quero erguer-te um castelo
Construirmos um futuro
Quer ver-te como a um espelho
E no reflexo paralelo
Ver a mente brilhar no escuro

Quero amar-te eternamente
Quero um desafio para a vida
E ter a mente evoluída
Que a promessa me jurou
No nosso corpo fervente

Quero a paixão eloquente
E o teu beijar alucinante
Quero caminhar sem demora
Quero o teu amor brilhante
Agora e para sempre

quarta-feira, 20 de abril de 2016

História de Adormecer



Uma noite coube-me a mim adormecer o meu irmãozinho Mateus de 5 anos.
O miúdo pediu-me que lhe contasse uma história, ao que eu perguntei:
-Mateusinho, sobre o que é que tu queres que seja a tua história?
-Sobre Legos
Então puxei pela minha cabeça e contei a história:


Era uma vez, uma Lego maçã, a Lego maçã, vivia na Lego macieira no Lego pomar. Um dia, a Lego maçã foi colhida e foi levada para o Lego A.M. Frutas.
Então, alguém comprou a Lego maçã, e levou-a para a Lego casa. Na Lego casa, a Lego maçã foi comida pelo Lego Mateus (o meu irmão), então, a Lego maçã desceu por um tubinho que tens no Lego pescoço, até ao Lego estômago onde andou às voltas a sofrer a ação dos Legos ácidos. Depois desceu para o Lego intestino onde andou a passear como uma senhora passeia no Shopping, até que depois saiu pelo teu Lego ânus no teu Lego rabo e já não era uma Lego maçã; era um Lego Co...
-Có - (completou o Mateus, continuei este jogo de deixá-lo acabar as palavras).
Isso mesmo, era um Lego Cocó, só que depois, o Lego Mateus, puxou o Lego autoclismo, e então, o Lego Co...
-Có!
Desceu pela Lego Sa...
-Nita
Até ao Lego esgo...
-To
Até a uma Lego estação...
-de comboios
Não, de tratamento de águas residuais, uma E.T.A.R

Então lá ele andou às voltinhas, numas coisinhas. Tanto andou à volta que o Lego cocó, chegou mesmo a vomitar (ainda bem que ele não perguntou o que é que o cocó andou a vomitar. Extremamente adequado para crianças de 5 anos, não é?). 


Até que um dia, o Lego cocó conseguiu escapar da Lego E.T.A.R. Então, ele decidiu que queria conhecer o Lego mundo.
E lá foi ele a viajar por muitas cidades, visitou a Lego Paris onde comeu as Lego baguetes e os Lego croissant! Foi a Lego Los Angeles e viu as estrelas de cinema versão Lego, todas aquelas divas são, como sabemos, um osso duro de roer, neste caso um brinquedo duro de roer. Andou na Lego Grã-Bretanha, na Lego Austrália, no Lego Brasil, muitos países em Lego África, as Lego muralhas da Lego China (que não são assim tão grandes… por serem lego… mas ainda assim…).
Até quem um dia, o Lego cocó decidiu tornar-se polícia para combater o crime. Entrou então na Lego academia e formou-se com sucesso.
O Lego cocó tornou-se então polícia e cedo começou a ser muito eficaz a prender os Lego ladrões. No entanto, ninguém na Lego esquadra gostava muito dele, e sabes porquê?
- Não
Porque ele é um cocó! E cheira a cocó, como tu, não é Mateus?
- Não, tu é que cheiras a cocó. – Disse-me o meu irmão a rir feito malandro!
Ao que eu lhe disse: “Depois trato-te da saúde meu pirralhinho.”
Continuando a história… Sempre que o Lego cocó precisava de falar com um Lego colega, eles tapavam sempre o nariz para não o cheirar, e evitavam que ele lhes tocasse… porque… enfim, é nojento!
O Lego cocó ficou então muito triste. Um dia quando chegou à Lego casa, foi tomar um banho para ver se se conseguia limpar e deixar de cheirar tão mal. Mas quando entrou na banheira e começou a tomar o banho de chuveiro, a água fez com que ele se desfizesse, portanto lá foi ele pelo Lego Ca...
-no
Pelo Lego cano abai…
- Xo
Até ao Lego esgo...
-To
Até a uma estação...
-de comboios
Não, de tratamento de águas residuais, uma E.T.A.R
E lá andou mais uma vez às voltinhas, numas coisinhas. Conseguiu escapar mais uma vez. Teve de ir buscar as suas partes desfeitas e voltar a unir-se.
Percebeu então que de nada valia tentar mudar-se, ele era como era e não valia a pena lamentar-se, simplesmente tinha de aceitar isso e bom humor, face ao assunto, ajuda sempre.
Voltou então à Lego esquadra e à sua rotina. Agora sempre que alguém ficava afetado com a sua presença, ele reagia dizendo uma piada. Destruía o stress e os tabus, todos reagiam com maior positividade.
- ÓH Mano, és mesmo totó. – Disse-me o meu irmão de 5 anos – Estás para aí a divagar filosoficamente sobre a vida e as situações das dificuldades da personagem em encarar quem ele é, mas tu não entendes que ninguém quer saber disso? Eu sou um puto de 5 anos, a única coisa que eu quero saber é de ação, brincadeira, etc… estou-me a borrifar para os problemas do Lego cocó! Portanto deixa-te dessas tretas filosóficas e lições de vida, e conta-me uma história de jeito! E já! – Disse certamente o meu irmãozinho… não me olhem assim, ele disse mesmo isso, eu juro!
- Quem mais jura mais mente
Silêncio Mateus, estou a contar a história às pessoas.
- Não, não estás, estás a contar a história a mim, para eu adormecer, por isso conta lá alguma coisa de jeito!
Ok, se assim o queres, assim o vais ter:
Um dia, chegou à Lego Cidade do Lego Cocó, um Lego ladrão que era muito mau. Esse Lego ladrão começou então a fazer muito mal às Lego pessoas. Roubava as Lego lojas, pegava fogo às Lego casas, era muito mau…
O Lego cocó começou, então, a trabalhar nesse caso. Seguiu umas pistas que indicavam que o Lego Ladrão ia roubar um Lego Diamante precioso do Lego museu. Então ele preparou uma armadilha para que quando o Lego Ladrão entrasse no Lego museu e chegasse ao pé do Lego Diamante, todas as portas do Lego museu iriam trancar-se, o Lego Ladrão ficaria preso no Lego museu, e o Lego cocó iria lá e prendê-lo-ia.
Foi então que uma noite, quando o Lego cocó estava à espera no Lego museu, o alarme disparou… o Lego ladrão estava lá dentro. O Lego cocó foi então até à sala do Lego Diamante, e lá estava, o Lego ladrão, com o Lego Diamante na mão e uma Lego pistola na outra a apontar para o Lego Cocó.

- Tu vais-me deixar sair daqui, senão eu mato-te. – Disse o Lego ladrão.
- Não, não vou. Eu vou-te prender e levar-te para a prisão porque tu foste muito mau para as pessoas!
(neste momento eu estava a fazer aquelas vozes super-cliché para o meu irmão gostar muito da história
- Muahahaha, isso é que era bom. – Disse o Lego ladrão enquanto se preparava para disparar a Lego pistola. Foi nesse momento que o Lego cocó se foi aproximando do bandido, enquanto este disparava, as Lego balas passavam pelo corpo do Lego cocó e ele não se queixava. Até que o cheiro a cocó era tão intenso que o Lego ladrão se deitou no chão a gemer e rendeu-se.
As balas nada fizeram pois… porque é que eu estou a explicar isto? É óbvio… tipo, ele era um cocó, é óbvio que as balas não vão fazer nada!!!
E assim, o Lego cocó ganhou o respeito de toda a gente que passaram a admirá-lo… mas à distância… ninguém queria que ele chegasse perto, porque enfim… cheira mal!

quinta-feira, 14 de abril de 2016

O João Pestana Reformou-se

(...texto com supressões...)


Em declarações à imprensa, a mítica personagem da infância de muitos seres humanos portugueses, afirmou:

-Após vários anos dedicado ao meu emprego de colocar crianças a dormir, decidi reformar-me. As razões por detrás desta reforma são unicamente a falta de condições para prosseguir! Após uma vida inteira devoto à causa de adormecer aqueles “piquenos” irrequietos para que os adultos se possam livrar deles por uns momentos a fim de recolherem ao quarto e… fazerem as coisas deles… não me interessa o que fazem no quarto a meio da tarde; para depois saírem do quarto outra vez, algumas vezes com a roupa ao contrário, e prosseguirem com a sua desinteressante rotina a que chamam vida. Muitos anos em que retirei as “coisas” mais irritantes que as mulheres criam em 9 meses, mais coisa menos coisa, da frente de muitos pais, mães, avós, professores, etc… para depois o quê? Nem um agradecimento? Nem um convite para ficar mais um tempo a beber um café e a comer umas bolachas? Nada!? As pessoas são muito ingratas! Ainda por cima, nunca me foi permitido brincar ou confraternizar com uma criança acordada, muitas até duvidavam da minha existência! Tudo porque os paizinhos tinham medo que elas, talvez, aprendessem comigo e acabassem numa profissão menosprezada. Tenho a dizer que a minha função na sociedade é importantíssima! E nunca em situação alguma recebi apoios, o estado não me ajuda. Para além disso, a petição para proporcionar salário à minha profissão foi chumbada, tudo porque todos os pais em Portugal não querem dispor de 12 cêntimos por mês para eu poder receber um salário decente. Nunca me foram reunidas condições aceitáveis para executar o meu trabalho de forma prática, no entanto, nunca me queixei, sempre adormeci os “piquenos” e pouco pedi em troca. Pois eu lamento esta sociedade em que vivemos! Não tendo condições, quero a reforma imediata!

O SDAP, Sindicato de Discretos Adormecedores de “Piquenos”, não se quis manifestar sobre o assunto, também porque apenas João Pestana estava inscrito no sindicato, não havia mais ninguém.
No entanto, com a enorme lista de desempregados neste país, já houve muitos currículos enviados! Um candidato já foi escolhido. É tido por todos como o mais adequado para o cargo, já por muitas vezes conseguiu adormecer milhões de pessoas apenas falando.
Com João Pestana reformado, cabe agora ao ex-ministro das finanças e do estado, Vítor Gaspar, a função de adormecer aquelas coisas “piquenas” e irrequietas que muito comem e recursos exploram… não me condenem, é assim que são conhecidas as crianças lá para as direitas.
Vítor Gaspar foi escolhido entre 214.087 candidatos para a posição. Depois de ter estado no desemprego (à semelhança das milhares de pessoas que lá colocou) o ex-ministro consegue agora um emprego diferente da área da sua especialidade (já ninguém lhe confia um cargo que implique gestão de dinheiro permitindo lucro). No entanto, Gaspar aceita o cargo. Entende que a sua antiga profissão era algo para o qual não era talhado. Agora sim, enveredou por um ramo profissional adequando à sua pessoa.
Gaspar adormecia milhões de portugueses com os seus discursos, as centenas de gatos pingados a que se chama deputados, o pessoal do partido, os jornalistas, etc… Tendo em conta o seu historial, considera-se que não será difícil adormecer as crianças, bastar-lhe-á falar no seu lento e monótono discurso, com a sua voz baixa e calmante: as crianças adormecem logo! E são capazes de fazer xixi na cama, mas isso já não é problema de Gaspar, quando esteve no governo nunca se preocupou com o bem-estar das pessoas, não é agora que se vai começar a preocupar.
(...)

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Histórias que Não Cabem na Cabeça de Ninguém



Apresentação dia 23 de abril pelas 26 no auditório da Escola Sec. Sebastião e Silva, Antigo Liceu de Oeiras.
Apresentação a cargo de Paula Castelar e Laurent Filipe com muitas mais surpresas

Mais informações em breve



Quando um jovem decide transpor para papel o que lhe vai na mente, nascem verdadeiras histórias que não cabem na cabeça de ninguém, ou não…


A compilação de “coisas” escritas entre os 11 e os 16 anos de idade reúne contos, poemas e peças de teatro.


Não são certamente as obras mais alucinantes que este jovem ator e autor terá para contar, mas está lançado o mote para uma leitura diferente das banalidades comuns. Histórias que não cabem na cabeça de ninguém é um primeiro passo rumo a um horizonte absolutamente desconhecido.


Coloca-se pela primeira vez em palavras a confusão de ideias que vão naquela mente, em histórias maioritariamente filosóficas de crítica social e com recurso à comédia.


Quem se atrever a aventurar por estas páginas de desvario jovem, terá, decerto, algo em que pensar quando acabar. É esse o objetivo, fazer pensar!

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Começo a Achar



Começo a achar

Deixa-me ficar só mais um momento
Não quero acordar para a minha vida
Quero este sonho no meu pensamento
Quero esta tempestade resolvida

Acordado não encontro a ventura
Pergunto onde estão as boas pessoas
Que me possam apoiar sem rotura
E se durmo, rujam como leoas

Começo a achar que todo o meu azar
É mesmo porque não enviei aquele
E-mail às dez pessoas que pedia
Ou porque não partilhei aquela foto
E agora sofro nove anos de azar
Por causa de uma e uma só rebeldia

Encanto em Flor


                            


A Serra cobre-se num branco manto
Donde nascem as cerejas em flor
Polvilhadas p’lo conterrâneo amor
Do ceifar neste campesino espanto


E já me enamoro deste recanto
Que lá jaz na Beira em todo o seu esplendor
Ladeado por serras de louvor
Governadas por um silêncio santo

Inspiro a aragem e num entretanto
Deleito-me no familiar sabor
Das memórias de júbilo e pranto

E dou as minhas graças ao criador
Por viver um horizonte em que implanto
Este resplandecente encanto em flor


   Aos Travassos e aos Salvados do Fundão

A Máquina de Lavar a Roupa que Dava Dinheiro em Tempos de Crise



 2013, o ano do auge da crise. As pessoas já vivem tanto numa simbiose com a recessão que já nem reclamam em voz alta e aos gritos, espantadíssimas com mais um corte ou outro subsídio penhorado. Já estão habituadas, limitam-se a dizer "olha, mais um!" ou a ligar ao psicólogo imaginário pois já não há dinheiro para o luxo de um verdadeiro. Ainda há aqueles cuja linha de suicídio os bloqueou pelas incessantes chamadas que para lá faziam. No entanto, continua a insatisfação e as manifestações na rua. Embora, todas inúteis pois nenhuma delas é organizada ou inteligente o suficiente para mexer com alguma coisa.
Enfim, tempos de Crise!
Tempos em que qualquer moedinha no fundo da carteira é uma fortuna inesperada.
E não é tão giro quando encontramos uma moeda no bolso das calças ou mesmo dentro da máquina de lavar a roupa após uma lavagem? O que me intriga é: Por que razão, intenção ou circunstância é que quando encontramos uma moeda após uma lavagem de roupa, é que essa moeda vem preta? O lógico é ela vir limpinha e a brilhar (com um cheiro repugnante a detergente)... Mas não, ela vem preta! (eu sei porquê, mas enfim).
Continuando...
Era uma vez uma família que se intrigava muito sobre o porquê das moedas que aparecem na máquina de lavar a roupa, virem pretas, ou cinzentas, ou castanhas, ou o que quer que seja. Uma família de classe média baixa de gente tolinha que nunca se interessou por nada de fantástico, a mãe ouve música pimba e romântica e o pai gosta de futebol e de adormecer a ver debates televisivos; a filha mais velha destas duas criaturas, é aquela adolescente irritante que prefere os olhos do cantor à música que ele canta, o filho é aquele miudinho brincalhão que só não come bichos-de-conta na escola porque a paixoneta dele está a olhar...
Enfim, uma família à portuguesa com certeza. Sempre que o pai chega a casa toca tudo a evacuar o sofá de família porque o homem não vê um boi à frente e não está para se interessar se esmaga um dos filhos nas suas banhas. Quando se descalça e deita no sofá, pede molengamente uma cerveja à mulher e pergunta desinteressadamente aos filhos se a escola correu bem, ao que os rebentos respondem, apressadamente, que sim (a garota deve-se estar a esquecer da negativa a matemática, e o rapazito igualmente não se recorda do banano que espetou na face do colega, e do consequente castigo que levou).
Uma família de constantes ocultações da realidade em que todos eles representam muito bem uma realidade fictícia e perfeita, quem me dera a mim realizar um filme e ter atores tão bons como estas criaturas!
Ora um sábado solarengo, após uma ida às compras com a filha (isto porque as mulheres podem não ter dinheiro para comer, mas no dia em que já não têm para ir às compras, aí sim começa o problema que nem a anos-luz pode ser medido!), a mulher pôs a roupa na máquina para a lavar, pôs também a roupa acabada de comprar pois sabe-se lá quem é que a andou a experimentar. Quem sabe se não foi um político, é melhor prevenir, não vá aquilo ser contagioso e depois é um enorme problema, que nojo!
Quando a mãe foi a tirar a roupa da máquina, notou no fundo da mesma, uma moeda de um euro. Pensou para os seus botões "olha, finalmente um político a dar dinheiro a outras pessoas", ficou contente por ver que trouxe qualquer coisa da loja com uma moedinha num bolso!
O evento foi-se repetindo repetidamente. Todas as vezes que se usava a máquina, uma nova moeda surgia lá do fundo, houve só algumas poucas exceções. A situação era um mistério, a mãe intrigada perguntava à família se alguém tinha deixado moedas em bolsos, todos respondiam que não, até que a bimba se lembrou da ideia estapafúrdia de que aquela máquina estaria encantada, a ideia pegou, mas também não era muito difícil, numa família de uma mulher “sopeira”, marido gordo e preguiçoso, filha pop e filho comedor de bichos-de-conta, o que é que se esperava?
A ideia foi ganhando cada vez mais credibilidade, os que duvidavam começavam agora a acreditar. Entretanto, a história começou a correr o país, o continente, o mundo. Vinham jornalistas de longe só para fazer a sua reportagem sobre a máquina de lavar que dá dinheiro. A família fez fama, algum dinheiro com publicidades, especialmente à marca da máquina. Lavavam agora muito mais a roupa para colher sempre a moedinha de 1 euro no fundo da máquina, por vezes nem precisavam de lavar a roupa mas faziam-no, havia ainda alturas em que a moeda não aparecia, mas na próxima lavagem já lá estava, uma nova e diferente a cada vez que se lavasse a roupa. A família achava que estava a fazer fortuna, sempre que usava a máquina ganhava 1 euro (só não se lembrava que pagava a conta do gás, água e eletricidade, mas enfim...).

A história continuava a passar por todo o lado, nas redes sociais era já diário, houve até na rádio um humorista chamado Nuno com um apelido estranho, que expôs a história numa rubrica que falava de coisas esquisitas. Enfim, a história prosseguiu na sua boémia.
Passou um ano, um ano e tal, e ainda em tempos de crise (porque enquanto o pessoal continuar a confiar nos grandes, não vamos lá), se falava da máquina. Aconteceu que um dia, a moeda não apareceu. Já habituada, a mãe prosseguiu "vem na próxima lavagem". A Moeda nem na próxima nem na a seguir estava lá. A catatua da mãe pôs-se aos guinchos a ver a vida toda a andar para trás e preocupadíssima com a saúde da máquina. Como o marido já não a podia ouvir, foi para o café ver o derby. Deixou a mulher aos guinchos e os filhos a aturá-la, é que aqueles guinchos lembravam-no do dia do casamento e ele não queria estar a pensar em coisas tristes, pior ainda foi a lua-de-mel em Marrocos, como ele não atinava bem com mapas, perderam-se no deserto, até aí tudo bem (ou mais ou menos) só que a mulher decidiu levar a sogra de pendura para a lua-de-mel, deixo ao critério do leitor imaginar o que aconteceu...
Passou um mês e a máquina não voltou a dar dinheiro, pelo contrário chegava a lavar a roupa com muito mais eficácia, mas o que é que isso interessava àquela família ao pé da tão desejada moedinha? O pai decidiu então levar a máquina a um médico, tentaram de tudo, o sr. Doutor, o veterinário, o mecânico, uma bruxa, um bruxo, uma senhora que falava com espíritos, o cão, o gato, o periquito, o mágico, os programas da tarde (que às vezes resolvem problemas destes), um sábio, uma sábia, o feiticeiro de Oz, outro mecânico, um mafioso, um inteligente, só se esqueceram de me perguntar a mim, porque, pois claro, eu saberia, sou o narrador desta história!
Nada resultou, para além disso o dinheiro que gastaram na bruxa para ela fazer uma macumba foi só prejuízo, a mulher esteve lá a dizer umas palavras esquisitas até aquilo funcionar, ao fim da primeira hora, disse logo "Eu recebo à hora, portanto se é para continuar, são mais 150 euros, ao passar da segunda hora, repetiu a frase, estava quase na terceira hora quando o pai perguntou se ela queria mais 150 para continuar, ao que a bruxa respondeu "Agora não que eu vou ter consulta de urologia às 4 da tarde".
A família estava desesperada. Perderam a esperança de recuperar a tão conceituada e mundialmente conhecida máquina de lavar a roupa. A máquina ainda lavava, e cada vez melhor, o cheirinho a lavanda irrompia pela vizinhança como um campo de madre silva numa manhã de verão, no entanto, a moedinha de um euro fazia falta.
Um dia aconteceu que apareceu uma moeda de dois euros na máquina. A família celebrou o sucedido, deu uma festa enorme. No entanto, tal evento não voltou a acontecer e o filho admitiu que aquela moeda de dois era sua, que ele tinha deixado no bolso das calças.
O desespero corrompeu a família. Tiveram algo interessante para partilhar com o mundo, algo que os fazia especiais, que os tornava diferentes.
Mas esta gentinha não pensa com cabeça, tudo o que é novo e invulgar é motivo para os "unir" (só um poucochinho). Tudo o que os faça ter fama, é algo pelo qual têm de lutar para sempre, pois a fama, para estas criaturas, é tudo! Só a inteligência nunca os acompanhou.
O rapaz tinha umas calças com um roto nos bolsos, a mãe pegou naquilo e deu para a caridade, da caridade, ofereceram a um menino órfão. Muito cedo, esse menino apercebeu-se que todos os dias aparecia naquelas calças uma moeda de um euro, se ele se esquecesse, a moeda caía do bolso devido ao roto. Esse menino fez então fortuna em publicidade à marca das calças. Como ficou rico, milhares de casais quiseram adotá-lo (só o oportunismo e interesseirismo que reina por este mundo! Não é só nos parlamentos, aliás, esses infernos na terra são apenas o espelho das sociedades que representam).
Qual máquina de lavar a roupa? A família vê só a meios olhos, e o filho estava demasiado preocupado em comer bichos-de-conta do que em notar que tinha umas calças mágicas em que todos os dias aparecia uma moeda de um euro que, ora caía do bolso roto, ora aparecia na máquina de lavar a roupa no dia de lavagem das calças.
A família foi enganada, quase como uma conspiração organizada por mim e pela bruxa, ela até se aproveitou da situação para ir lá ganhar mais uns trocos. Viveram então o resto dos seus dias deprimidos com a máquina que já não funcionava, só lavava roupa, que chatice! E ainda o fez por mais uns aninhos, e cada vez melhor, só o cheirinho a flores do campo, que maravilha. Mas o rancor apoderou-se da mãe que um dia decidiu desfazê-la à marretada. E assim se terminou a “máquina de lavar a roupa que dava dinheiro em tempos de crise”. Mas felizmente, o materialismo triunfou, pois foram logo a correr comprar mais uma máquina. E quando essa se avariava… outra. E outra, e mais uma, e por aí fora. Tudo porque a indústria de máquinas de lavar a roupa não lucra lá grande coisa se a maquinaria for duradoura. É preciso um “incentivo à troca”…
O rapaz órfão lá viveu com as suas calcinhas mágicas e rotas que se tornaram a sua razão de viver... Até arranjar uma namorada, depois disso guardou as calças no sótão da sua casa, isto já em adulto. Houve um dia que o teto caiu e por ele, irromperam um número exorbitante de moedas de um euro. Como o órfão já tinha 40 anos, muito tempo passara, o euro já não valia nada, o que valia era o Yeng, a moeda chinesa. Isto por que a China, por essa altura, já dominava quase todo o mundo.



Miguel Partidário,
Março de 2013